Arquivo da tag: Dakar

Sarah Carrère, artista senegalesca

Marilda Confortin enviou mais uma contribuição. Riquíssima, por sinal, pois se trata de uma artista do Senegal, mais famosa por sua música, mas que também faz poesia. Diz-nos Marilda: “Sarah Carrère M’Bodj é do sarahcarrereSenegal. Poeta, tradutora e musicista. É a única artista feminina que levou, além das fronteiras da África, a arte de tocar Kora, um instrumento musical africano, tradicionalmente, até agora, de uso exclusivo dos homens. Eu conheci  Sarah e seu instrumento exótico na Nicarágua, durante o festival de Poesia. Ela quer muito conhecer o Brasil. Quem sabe hora dessas ela apareça por aqui e vocês tenham o prazer de conhecê-la e ouvi-la”.

Enquanto não temos o prazer de conhecê-la pessoalmente, conheçamos sua poesia, no exemplo que vai abaixo. A versão em Espanhol (o original deve ter sido escrito em Francês, que é o idioma do Senagal) recebe aqui uma versão em Português.

Testamento

baoba37

Que mi cuerpo descanse dentro de un Baobab hueco
con el olor de resina y de madera
y que retenga conmigo los secretos maravillosos
que me han confiado los « Griots », los sabios, y los reyes

Que mi cuerpo descanse dentro de un Baobab hueco
donde los hombres acudirían todos en peregrinación
ya las escuchara, pensadora y silenciosa
al rededor del árbol, crecería flores salvajes

Que mi cuerpo descanse dentro de un Baobab hueco
en la llanura mas allá, donde caminan los zebúes blancos
y se den citas los pastores enamorados
para observar el vuelo de los Cormorans

Que mi cuerpo descanse en un Baobab hueco
encima de la colina color de sombra quemada
lejos de los ruidos de los hombres
mas cerca de los rumores divinos
percibire cantos de la selva sagrada

Aquí estoy, descansando por fin en un Baobab hueco
las estrellas arriba , lucen como Cauris
el cielo es como un sudario tendido de Basin azul
La Osa Grande y Orion, complices, me sonrien…. !

Han crecido los Baobas que llegan la Castel
yo conoci Gorée con su muelle de madera
su baile de Signaras, mariposas de encajes.
En Dakar existían solamente chabolas y avenidadas arenosasas
¿Dónde están las casas de madera de la calle Rafenel ?
¿Los jardines florecidos bordeados de cocoteros ?
Donde la gente se divertía en los quioscos de músicos ?
Con concursos de tiro y carreras a pie ?

La peninsula de Cabo Verde donde esta Dakar
esmaltada de puentes sobre pilotes
rodeadas de basalto
está siempre aquí,
mojando el gran azul.

Testamento

Que meu corpo descanse dentro de um baobá oco
com o cheiro de resina e de madeira
e que retenha comigo os segredos maravilhosos
que me confiaram os griots, os sábios e os reis

Que meu corpo descanse dentro de um baobá oco
onde os homens acudiriam a todos em peregrinação
já as escutara, pensadora e silenciosa
ao redor da árvore, cresceriam flores selvagens

Que meu corpo descanse dentro de um baobá oco
Na planície distante, onde caminham os zebus brancos
e marcam encontros os pastores enamorados
para observar o voo dos cormorões

Que meu corpo descanse em um baobá oco
acima da colina cor de sombra queimada
longe dos ruídos dos homens
mas próximo aos rumores divinos
perceberei cantos da selva sagrada

Aqui estou, descansando por fim em um baobá oco
as estrelas acima luzem como cauris
o céu é como um sudário estendido da bacia azul
A Ursa Maior e Órion, cúmplices, me sorriem…. !

Cresceram os baobás que chegam a Castel
eu conheci Goré com seu molhe de madeira
seu baile de signaras, borboletas de rendas.
Em Dakar existiam somente barracos e avenidas arenosas
Onde estão as casas de madeira da rua Rafenel?
Os jardins floridos bordejados de coqueiros?
Onde a gente se divertia nos quiosques de músicos?
Com concursos de tiro e corridas a pé?

A península de Cabo Verde onde está Dakar
esmaltada de pontes sobre pilotis
rodeadas de basalto
está sempre aqui,
molhando o grande azul.

______________

Notas

baoba_recifeBaobá – grande árvore da família das bombacáceas (Adansonia digitata), encontrada nas savanas africanas, de tronco bastante espesso, rico em reservas de água, e considerado o mais grosso tronco do mundo. Foi popularizado  pelo texto de Saint Exupéry, “O Pequeno Príncipe” (“Não compreendi logo porque era tão importante que os carneiros comessem arbustos. Mas o principezinho acrescentou:
– Por conseguinte eles comem também os baobás?
Fiz notar ao principezinho que os baobás não são arbustos, mas árvores grandes como igrejas. E que mesmo que ele levasse consigo todo um rebanho de elefantes, eles não chegariam a dar cabo de um único baobá.”)
Dizem que o escritor francês inspirou-se no baobá existente na Praça da República, no Recife (foto acima), quando por ali passou.
No Brasil há poucos exemplares de baobás, trazidos da África pelos sacerdotes daquele continente, pois a árvore era utilizada nos ritos religiosos dos escravos.
Goré – ilha do Senegal, declarada como patrimônio mundial pela Unesco.
Signara – ritmo da música senegalesca; tipo feminino de Goré, que utiliza fantasias em suas danças.

Castel – ruínas de fortificações datadas de várias épocas

Griots – contadores de história; correspondem aos bardos medievais.

Cauris – caramujos usados pelos adivinhos africanos; correspondem aos búzios brasileiros.

korKora ou corá – instrumento musical tradicional do Senegal, de origem mandinga,  se constitui em ferramenta de trabalho dos griots africanos.
Feito de uma cabaça fechada com couro e ligada a um cabo por 21 cordas (atualmente são usados fios de pesca). Tocada quase na vertical, sobre os joelhos do executante sentado, que pinça as cordas com as duas mãos, com os dedos polegar e índice. As cordas são tocadas com as duas mãos – 11 com a mão esquerda e 10 com a direita.